Apesar da minha tendência anti-clerical, ou exactamente por causa dela, não me tenho manifestado sobre o tema "quente" que volta a abanar os alicerces do Vaticano. Depois de muito pensar (às vezes dá-me pra' isso) achei que manter a distância sobre o tema era dar azo à discriminação positiva. Pior, era ter complexos e equiparar o meu não catolicismo ao triste espectáculo que a igreja católica tem vindo a permitir.
Não consigo imaginar o que os católicos de bem podem sentir, no âmago da sua fé, ao assistirem à sucessão de casos e casos de comportamento desviante e abjecto dos seus representantes. Não só os actos em si são inqualificáveis e dignos de ida directa para o calobouço até ao fim da vida dos abusadores; não só há vitimas que nunca mais superarão a humilhação que lhes foi infligida; como os criminosos actuavam com base na confiança que a batina lhes conferia junto das suas comunidades e em claro abuso de poder.
Portanto, se eu fosse católica desconfio que me sentiria traída, magoada e triste pelas vitimas, envergonhada por quem manchou os simbolos da minha fé. Acho eu!
Se eu fosse católica (que não sou, reitero, a bem da transparência; mas tenho uma coisa chamada de valores) quereria que estes reais filhos da puta fossem devidamente punidos pelos seus actos e restaurar à igreja o seu papel como agente de religião.
Curiosamente, as manifestações dos católicos (que não são nem clero nem vitimas ou família de vitimas) têm sido inexplicáveis, ainda que não me surpreendam. Ao silêncio mudo e quedo, ignorando a questão, há outros que falam de conspiracões ou, melhor, que a igreja é atacada sem dó mas ninguém comenta o que se passa no seio das comunidades muçulmanas, por exemplo.
A primeira atitude é vergonhosa, sobretudo porque quando o tema lhes afecta o código moral, como o aborto ou o casamento gay, não há palavras nem ódio que os trave. Quando se trata de pedofilia praticada pelos seus padres, bispos e afins, já piam todos de fininho e assobiam pro' lado, como se não fosse nada com eles. Devo dizer que, na minha opinião, pedofilia perpetrada em instituições religiosas por membros da igreja é um assunto que lhes diz em TUDO respeito vs. o aborto que outras pessoas façam ou as escolhas sexuais de terceiros.
A segunda atitude seria patética se a questão não fosse grave. Que há pedófilos em qualquer lado, infelizmente, sabe-se, mas isso é desculpa para que eles existam na igreja católica? E tantos? E impunes? E sendo a igreja católica tão rápida a criticar as atitudes dos outros não devia ter mais cuidado com as suas criminosas abóbodas de vidro, antes de arremesar as pedras?
Por outro lado, não sabemos o que se passa nas outras comunidades religiosas mas isso não implica que se justifiquem os desvios dos padres católicos. Talvez não encobrir criminosos mas sim procurar as razões para este cenário escabroso fosse mais inteligente: os pedófilos tornam-se padres sem que ninguèm perceba? Depois de ser-se padre, a pedofilia torna-se normal? E como convivem o catolicismo e a pedofilia aos olhos daqueles que viram a cara? Vezes sem conta.
Todas as minhas ideias sobre este tema saíram reforçadas com este assaz ilustrativo comentário do Padre Feytor Pinto:
"(...) Ao bispo não compete "denunciar" aqueles que prevaricam. (...) Um pai nunca pode denunciar um filho. Um bispo nunca pode entregar um padre ou um fiel à policia."
A lógica aparenta ser indestrutivel. Tristemente.
Mas este discurso bafiento, promotor da "cegueira" e da manutenção do status quo de violência intramuros, se há de facto 1 deus, que tenha misericórdia destas almas. Elas bem precisam.
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