Vocês não imaginam os ruidos que se passam num aeroporto depois deste encerrar ao publico. A máquina/carrinho de encerar, que passa vezes sem conta, com seu alerta qual grilo. A máquina que alisa as superficies e arestas das montras. Brocas e berbequins numa casa de banho em remodelação. Uma chave de parafusos que cai no chão. Os gritos masculinos que tentam sobrepor-se. E tudo se ouve numa ala escondida, num andar superior, onde camas de campanha alinhadas parecem um cruzamento do Big Brother com o descanso dos peregrinos nos salões dos bombeiros.
Sempre advoguei, até há uns meses a não privatização da TAP (aliás, sou céptica quanto às privatizações no geral). Admito que tenho mudado de opinião. Asseguro, sem duvida alguma, ao dia de hoje, que privatizem o raio da companhia e já. O que vale ter a treta de uma "companhia bandeira" quando esta só está disponivel para os seus passageiros até às 19:30h ou, em dia de jogo, até às 19h? Ou em caso de problema, até haver noção do mesmo e, a partir daí, salve-se quem puder? Privatize-se!
Introduzam-se critérios de eficácia, eficiência, produtividade, métricas normais de exigência de quem serve ao publico. Já basta de aturar as merdas de greves, avisos de greve, sobre temas que ninguem percebe. Por vezes, soa injusto punir o gostinho pela greve que pilotos, tripulantes, pessoal de terra têm. Com tanta mordomia, viagens para as familias e amigos, baixas por gripe, e afins, os argumentos para a paralisação tendem a perder-se e há a sensação de que, no contexto do país, aqueles que podem ser considerados privilegiados, esticam a corda. E pode ser abusivo, é um facto. Mas uma pessoa faz um esforço para "'bora lá entender...." e uhuhuh ... Nada! É o vazio. Só espuma.
E quando se percebe o quão estupidamente mal funciona esta empresa, que no mundo das agressivas low cost, e perante a concorrência de outras companhias de "marca", se dá ao luxo de hostilizar um avião inteiro e passar um atestado de abandono a quem pagou o seu bilhete (não assim tão barato), percebe-se que:
- as politicas de gestão são rigidas, inconsistentes e pouco pensadas;
- não há planeamento de gestão de crises;
- impera a inexistência de conceitos como excelência operacional ou orientação / satisfação do cliente;
- há incapacidade de resposta na resolução de problemas;
- os recursos (humanos) são muito fracos e as politicas de supervisão modestas ou desadequadas.
Contexto: um avião tem horário de saida às 20h30 e de embarque às 20h00. É suposto que no limite chegue a Paris às 19h00. É profundamente estúpido que não saiando sequer de Lisboa (abortando, desde logo, um voo de ida), alegadamente com uma avaria técnica, às 18:30 se vendam ainda bilhetes em Orly para o voo de regresso a Lisboa. Onde raio falha a comunicação? Melhor: existe o conceito de comunicação?
Porque 20 minutos antes uma pessoa do check-in sabia que o avião não tinha saido de solo luso. A 50 metros, o balcão, onde tudo se passa, nem aí. Quando à hora de embarque, após um primeiro aviso de atraso, poucos minutos antes, aparece nos ecrãs "Cancelado", não há ninguém para prestar uma informação. As pessoas têm que voltar a passar a segurança e ir ao check-in. E a partir daí, um desastre.
No check-in pouco podem fazer. Não há mais voos TAP para Portugal, portanto resta distribuir todos passageiros pelos lugares vagos nos voos do dia seguinte, recolher bagagem já despachada e aguardar que nos indiquem ou levem ao hotel.Um avião esgotado, ou quase, amontoa-se com duvidas perante 2, DOIS, funcionários do check in, luso descendentes, farda TAP mas sub contratados. Esforçadissimos e pacientes a aturarem o desagrado generalizado (e crescente) e a fazerem ponte com os únicos responsáveis que apareceram: 2 franceses da gestão do aeroporto. Na prática, ninguém pertence à TAP.
A transferência de passageiros demora uma eternidade, culpa do sistema no qual os voos TAP estão alojados, que não desbloqueava a troca de bilhetes. E arrasta-se numa penosa perspectiva de flexibilidade nula. Prioridade: executive, gold & silver cards e passageiros com crianças. Assim, acabam os lugares disponiveis, nos voos matinais. Ou mais ou menos, porque sobram lugares em executiva mas é preferivel deixar as pessoas até ás 5, 6 ou da 7 da tarde, do dia seguinte, à seca, com transtornos na sua vida, e sem que tenham culpa, do que encher os aviões o mais possivel para minimizar o impacto inesperado, e totalmente culpa da TAP, nos passageiros. Também não é possivel trocar os passageiros para destinos como o Porto, apesar de haver voos cedo, e lugares, mesmo quando os viajantes se disponibilizaram para arcar com a conta, coisa que a bem da verdade devia ser uma medida de problem solving da puta da TAP ... Porque só é possivel, em sede de check in, trocar um bilhete por outro identico, independentemente das razões que geraram a situação.
Temos, pois, cento e muitas pessoas chateadissimas, com o nivel de stress em alturas vertiginosas, a quem convem apresentar algum cenário de opções e não é possivel:
- fazer upgrade de bilhetes;
- trocar destinos, dentro do território de destino, como forma de facilitar o "escoamento";
- considerar vagas em voos a partir de Charles de Gaulle;
- aproveitar a porra da rede Star Alliance e explorar possibilidades de voos noutras companhias.
Não só os operadores de check-in não têm autorização nem um sistema que permita parte disto, como quem pode fazê-lo já tinha ido para casa e NUNCA apareceu (seria de esperar que havendo um ultimo voo às 20h30, alguém do balcão TAP, mesmo este fechando às 19:30 - ainda que de facto tenha fechado um "pedacinho" antes-, estivesse de prevenção para uma situação destas), como ainda muitas destas ideias nem sequer estão consagradas. Para que raio então há voos em Charles de Gaulle ou para quê tanta chinfrineira com a Star Alliance? É que as coisas devem dar jeito quando necessárias, quando são realmente uteis às pessoas, e não resumirem-se a meros conceitos!
Giro, giro é a linha de apoio TAP em França para a qual se liga e está direccionada para Portugal, onde reiteradamente nos diziam desconhecer que havia um voo cancelado. A sério, esta gente trabalha onde?
Com a transferência a exasperar os fregueses, o aeroporto foi-se esvaziando até só restarmos nós. Os balcões das restantes companhias encerraram. Lojas, cafés e restaurantes, idem. A ida para o hotel tornou-se um mistério. De repente, "ah e tal... não há hoteis num raio de 80km." Perdão? Como? Importa-se de repetir?
Mais de uma hora nisto. Os hoteis utilizados nestas circunstâncias ou estavam cheios ou praticavam preços fora do normal; os demais tinham preços desde logo acima do plafond definido pela TAP e dado que da TAP NINGUEM aparecia, eles não podiam tomar a decisão. Apesar de telefonemas em catadupa, só algumas familias, com crianças iam sendo chamadas, e o cenário viável às 23h00 era dormir em camas de campanha no espaço preparado para tal. A parte menos boa... Não havia jantar para ninguém. A cama não era desconfortável. Mas frio pra' caraças! E um cheiro a casa de banho de avião horrivel. Não obstante, quem optou por arriscar no hotel, esperou uma hora mais por um autocarro que os levou para um hotel a 60km (um motel na verdade!), com péssimas condições, sem comida, e apesarem de ter chegado jà 1 da madrugada, tinham que regressar forçosamente às 8 da manhã. E ainda se perderam pelo caminho. Oh maravilha!
E adivinhem lá qual o boato que andava a pra' lá de mal educada e indelicada tripulação de terra a espalhar de manhã (aka, às 6h30)? Que tinham distribuido 120 jantares na noite anterior. É giro pois 120 pessoas alimentaram-se ou do nada ou de bolachas e chocolates que tinham consigo; e porque ... bom, não havia tripulação nem de PVC nas redondezas.
A parte boa: regressar. Deixar França para trás. Comer. Dormir. Não ouvir francês.
A parte menos boa: vir na ultima fila, mesmo ao pé da "cozinha" e ter que partilhar quase 2 horas de conversas "profissionais" de 3 hospedeiras: como bisbilhotar o telemóvel de um namorado sem ele se aperceber (só quando ele estiver a dormir) e que tal é legitimo se há desconfianças de traição; o drama do herpes genital; dormir ou não com um piloto já divorciado de outras 2 hospedeiras.
TAP... Privatizem, a sério!
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