Atravessei uma imensidão de deserto árido e floresta
densa abrasadora para chegar ao mar. Andei em guerra comigo e com o mundo, com
moinhos de vento, com a minha sombra. Uma pressa. Uma avidez em superar-me. Em
preencher-me. A ansiedade de provar, a mim, aos outros. Intensidade em tudo,
opiniões, decisões, sentimentos. Viver no limite do arrebatamento.
Cansa. Desgasta. Não elimina sensação de vazio. Não traz
mais paz de espírito. Há uma gula continua pelo amanhã. Por outras coisas. Por
satisfação. Por descoberta. Por motores em sobrecarga, potência máxima como se
o mundo fosse acabar e tudo tivesse que ser esgotado.
E um dia queres qualquer coisa que não sabes o que é.
Sabes que é outra coisa. É algo que te alimenta a paixão, a vontade de viver
com risos, dar suporte para as quedas, uma construção em que participas e que
te sentes cada vez mais envolvida, não arremessada para segundo plano. É teu. É
de alguém.
Queres calma mesmo sem perder dose de loucura. Queres
silencio pelo meio de um coração galopante que se ouve indistintamente. Queres
significado e trazer valor. Queres um olhar devolvido com intenção, sem pudor,
com nu de verdades.
O desassossego vai perdendo força quão mais claro fica o
que se pretende. A impaciência transforma-se em distanciamento. Não vale a pena
lutar contra os elementos. Continuamos a fervilhar mas já não corremos sem
parar e sem destino. Ser selvagem não requer ser domesticado, apenas pede razão
para abrandar.
Resta entrar no mar e deixar que as ondas rebentem,
purificando, massacrando a derme com o frio e a força. Mergulhar e voltar à
superfície. Olhar o céu e finalmente boiar. Está ali o destino.
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