Ao Domingo custa mais.
É quando mais apetece ficar na cama, deixar o sono escapar-se devagar, sentir a companhia do lençol no rosto e permitir que a almofada seja o centro do mundo. Por onde nós passamos em sonhos. Só em sonhos. E em cada Domingo, ao acordar e espreguiçar as esperanças, a cama está vazia e os lençóis brancos cobrem a tua ausência de modo discreto para que eu não dê por ela.
Nos últimos tempos arrepio-me ao pensar que, num qualquer futuro, vou pensar como teria sido. Irei guardar sempre em mim as duvidas do que nos poderia ter acontecido. Hei-de acordar em outras manhãs de Domingo e o meu primeiro pensamento, mal abra os olhos será: "nunca estive com ele numa manhã assim."
Acordarei com outros ao meu lado, alguém que me faça ter vontade de ficar na cama nessas outras manhãs e, mesmo assim, em alguns domingos vou ter saudades desses abraços com que nunca me aqueceste, das gargalhadas que podíamos ter partilhado enquanto tomássemos o pequeno almoço em conjunto. Torradas com manteiga, leite quente com chocolate. Que bom que são as manhãs de Inverno, com livros no chão e a preguiça tremenda que não me permite afastar de ti. E depois percebo que não és tu que buscas o meu corpo na cama grande e deixo-me enlaçar atirando para longe a ideia de que naquele momento acordas feliz ao lado da tranquilidade de outro alguém.
E em cada caída no travesseiro só peço que na manhã seguinte o despertar não traga a sensação que é Domingo, aquela alvorada em que tudo á minha volta me faz recordar que tu já passaste por mim. Desse cruzamento tão rápido nada ficou, o teu rosto por vezes já nem consigo ver, mas apesar de fileiras tão cerradas, após noites em branco, de passeios sem rumo, fiquei parada num instante de ti.
E em cada manhã de Domingo é esse instante que me prende e se repete. Como se estivesses ali. Acendo o telemóvel, mas não tenho mensagens. Como é Domingo nem poderei receber uma carta tua. Como se alguma vez me tivesses escrito. Tão pouco, quase nada, me deste. E eu sem perceber porque não te podia dar, porque tanto te recusavas a receber. Era tão pouco o que tínhamos que fazer, tão fácil até.
Podíamos ter acordado um dia e qual casal de velhotes amorosos, com respeitáveis roupas de dormir, olharmo-nos nos olhos com carinho e sorrir perante as fotografias dos netos. A t-shirt branca é, no entanto, a única companhia que envelhece comigo nesta cama.
É Domingo de manhã outonal e já chove. Sabe bem ouvir a chuva. A lassidão cresceu a cada momento, não me apetece levantar, também não tenho onde ir. Fico a observar pela janela. Está uma manhã de Domingo perfeita, mas faltas tu para lhe conferir algo mais de sabor. Que Domingo passe rapidamente, que outras manhãs venham, ainda que não te tragam com elas. Opto por me aninhar no sono e pedir que amanhã chegue depressa.
(mónica pinheiro, autoria)
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