Talvez sejam as pequenas coisas. Como uma música que se ouve por acaso e se torna uma descoberta que nos marca um trânsito. Como um gelado fora de horas e com o sabor simplesmente certo de caramelo tal qual na nossa infância. Como aquele instante rápido entre fazer-nos à onda e o mar que nos toma por completo, nos restitui a energia e nos devolve ao mundo.
Terão que ser as pequenas coisas. A partir delas, tudo se enreda e o equilibro pesa para o complicado. Sinuosos os caminhos para que nos encontremos. Doloroso o andamento que faz que nos afastemos mais do que estejamos próximos mesmo quando tudo aponta para que haja uma cumplicidade e uma ligação súbita mas forte e consistente.
O toque é denunciador. Desmantela as forças e faz sucumbir com tamanho ardor. O beijo que transporta silêncio, paz, meta. O abraço que acolhe uma gargalhada e o estranho sentido de que tudo está bem.
São estas pequenas coisas. Que são fáceis e leves e perenes. Tão frágeis. Acabam tão depressa. Nada há-de ser fácil. Nada pode ser tão confortável. Nada nos pode ser permitido por ganhar asas. Somos bombas relógios e alvos a abater numa combinação simultânea de fragilidades.
São as pequenas coisas que nos trazem uma centelha de que a vida está a pulsar e pede que nos deixemos ir. E por elas nos enredamos e nos destruímos mais um pouco. Ou ardemos na totalidade. As pequenas coisas dão-nos alento e corroem-nos quase de imediato. Somos emocionalmente apáticos. Deixamos que as pequenas coisas do passado criem uma cratera na nossa capacidade de estar. E as pequenas coisas que nos vão acontecendo são milagres momentâneos que nos roubam de seguida. Ou que roubamos a nós próprios porque não sabemos lidar com as coisas da vida.
Pelo meio das pequenas coisas, que podiam abrir o caminho para um grande algo, perdemos a esperança, gastamos as últimas moedas e desistimos de construir.
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