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Mensagens

A mostrar mensagens de outubro, 2017

Do mundo que nos separa

Via-te diariamente. Com atitude firme, distante, tão cheio de si próprio. Sempre indisponível. Com sorriso displicente de quem se sente tão confortável em si mesmo.  As mãos, com que pegavas no café, com que brincavas distraidamente com a colher, com que acendias de forma dramática o cigarro, com pausas que soavam a descargas eléctricas. Será que alguma vez me descortinaste na passagem? Reconheceste o meu andar tímido perante a tua presença ou a minha gargalhada mesmo que ao longe?  Sempre te quis agarrado a mim mas nunca o quis assumir. Era um plano falhado mesmo antes de posto em papel tal o mundo que nos separava.  E mesmo assim deixei que me consumisses aos poucos. Com desabafos de vida, com confissões de amigos, com ombros que aguentam todos embates, com risos tolos destilados pela madrugada e pelo álcool.

Das não promessas

Não prometeste nada. Esse é a zona de protecção fácil. Os teus dedos pousaram no meu pescoço, nunca como uma jura mas sim como uma despedida, em cada caricia, repetida, sempre com intenção. Sempre como negação do que pode vir a seguir.  Não escapamos mas marcas o compasso com desdém, com ausência sentida, contrariando qualquer afecto como se eu fosse demasiado forte e abrupta no teu mundo de alquimista solitário.

Do desprendimento

"Aproxima-te, és distante, deixa que os meus abraços te toquem para lá do corpo.  - Isto que sou não é suficiente? - Não, quero mais de ti. Ver os olhos a brilhar e sorrires, solta.  - O teu conforto é a minha inquietação. O meu melhor é o desprendimento, não dar nada por adquirido e querer sempre mais. A minha loucura são cheiros, conversas sobre tudo e sobre nada, desejo, musica. Que mais queres?  - Acalmar-te, dar-te paz. - Para quê? Para definhar na sombra?"

Da cor dos sonhos

De que cor são os teus sonhos quando estou neles? Será que me vês sequer enquanto dormes?  Passo-te ligeira e ao de leve pela derme como se fosse uma pena que arrepia mas não se queda com substancia. Não me agarras, apenas sopras ao sabor do vento como se fosse tudo fácil. Tens-me próximo, mas sabes que estou fora do universo que cada um traçou para si. Assim, sim, é fácil. Não colidimos após cada abraço. Mas também não rimos, com vontade. Não há espaço para toques demorados de comoção, apenas fugas intensas. Inexplicáveis. E sem gargalhadas, que me baralha as emoções.  Será que me imaginas em cheiro? Quando estás a sonhar acordado?

Do tarde demais

O cigarro estava no fim. Ardia devagar, sem conhecer a pressa do ardor dela.  Ele entrou de rompante, sorriu e isso afectou-a. Pô-la de alerta.  Palavras ecoaram. Ela não as entendeu. Nem sequer as escutou. Divagava perdida na voz dele, no ácido acutilante que ela representava, invadindo-lhe o espírito com lembranças desgastadas, num ritmo pausado mas devastador.  Anuiu, por fim, maquinalmente. Já n ão se sentia dona de si mesma, perdia as forças sem, contudo, o revelar; arrastava-se na corrente simulando estar ancorada; tremia, enfim, sem deixar perceber as fendas. Olharam-se, por instantes, olhos nos olhos e o universo girou, paz e guerra colidiram, o tempo parou como se nunca tivesse tido inicio.  Bailaram a dois, algures uma sinfonia tocava só para eles mas tão baixo que eles não escutaram, não sentiram e debandaram. Ambos queriam fugir dali. Afastarem-se para longe do desconforto que cada um infligia ao outro.  As mãos trémulas dela...

Da minha janela

Da minha janela vejo o Tejo em esplendor iluminado por uma indolência do aqui e agora que acompanha a minha vontade de estar em ti.  Com esta vista rasgada sobre a quietude do rio, com o sol a querer rebentar por entre nuvens que me toldam o discernimento, ma aceleram as pulsações, me trazem flashes de uma cena de filme em câmara lenta, inversamente proporcional ao meu desejo. Acelerado. Sem limit es.  O toque, a caída no campo de batalha derrotada pelo que não quero controlar. Loucura e cigarros. Pele contra pele, febril no pico do inverno. Fogo de artifício que se alimenta de cumplicidade.  Da minha janela vejo a imensidão de azul apaziguador que me rende à entrega. Mesmo na impossibilidade, é neste desencontro que vou bendizendo o rio que me invade de ti.

Dos outros e do genuíno

Somos carinho em pó. Junta-se água, mistura-se e temos uma dose quente de conforto e um abraço próximo. Porém, somos aço. Impenetráveis e encerrados quando nos ferem. A pele, o ego, a confiança. Pedem-nos autenticidade como paradigma último. Não obstante, mesmo quando julgamos estar na zona de cessar fogo, estamos sob olhar cerrado pela nossa diferença. Pelo que nos apetece. Pelo que pensamos. Pelo modo como nos deslocamos. Diferente. Essa estranha forma de vida. Esse querer de outro modo. Esse desejar mais. Essa fantasia com a luxúria material e dos sentidos. O hedonismo passou à ilegalidade ou de tão incompreendido apenas deve ser banido pelo desconforto que provoca nos que nos são próximos? Amamos de menos quando tanto mais usamos apenas o corpo. Amamos a mais coisas como se a nossa noção de belo não tenha valor. Nem que seja para nós. Ser genuíno é como pregão de feirante. Vale o que vale. Não vale a pena ser por inteiro porque vai sempre colidir ou incomodar...

Do que nada mudou

E agora?  Nada muda, na verdade. A terra tremeu apenas por momentos e só nós sentimos. Eu, na pele, saboreada entre alucinação e crueza. Tu, com a intensidade de quem se propõe a ignorar logo de seguida.  Mas o mundo seguiu no seu curso normal. Nenhuma erupção parou a vida tal como ela é. Não salvámos vidas. Nem as nossas.  A minha permanece neste exaltado desalinho de tudo ou nada, agora e já ou nu nca, nesta impaciência de quem não tem espaço para mais dores nem desejo por desalento. A tua na calma hesitação de quem tem o mundo na ponta dos dedos, como se música fora que saísse do teu recatado turbilhão emocional.  Não descobrimos novos caminhos. O meu continua em passo acelerado para algures onde finalmente repouse este ardor e explosão de fazer, a pedir de ser domado. O teu queda-se na distante solidão segura, desconcertante, madura.  Segue tudo como é, como já foi, como será. Impassível. Com o suave sabor de um acaso

Do sentir-te saudades

Aninhada em insónias vívidas, sinto-te saudades. Do nada, da semi-escuridão para onde te atirei, da voz acelerada quando falavas a nervos sobre os insignificantes do dia a dia mas que eram uma ponte que abanava entre nós. Partilha, vontade de partilha, medo da partilha, e ausência.  Sinto-te saudades dos silêncios reflexivos, como se eu não existisse, quebrados por banalidades que de repente eram tão importantes.  Sinto-te saudades entregue no meu colo, com receio meu de te acordar à mais suave das carícias e controlando a força dos meus impulsos para te proteger das agruras, do cansaço; da incapacidade de sentires que há um mundo de afectos, consistentes e a diário mais fortes, que te ampara.  Sinto-te saudades, algo tão intenso   como maduro, assustador e seguro.  

Dos amores que não cessam

Quanto tempo dura um amor?   Instantes são suficientes para aqueles que se apaixonam todos os dias no metro. O tempo de uma viagem que enche o peito de ânimo e bem estar e cessa a memória em horas sem dor ou mágoa.   Podem ser semanas nos amores de verão, carregados de sol, beijos apressados, à sucapa, noites longas de copo na mão e areia na roupa madrugada dentro.   Ou serão anos, quando somos adultos e achamos que ser adulto é ter um amor à espera em casa, que nos acompanhe o de vamos, que nos dê a mão nos embates, nos aceite com tolerância e estima até ao dia que a rotina, o desgaste, os Eu se diferenciam e alguém percebe que esse amor se esgotou.   Pode ser metade de uma vida? Sem reciprocidade, sem materialização , sem proximidade? Podem ser tantos anos desde quando tudo começou? E qual castigo - um fica aprisionado a esta sina de ter o outro colado a si?  Venham outros amores, venham outros amantes, venham dores, venham alegrias, e...

Porque te quero

via @ boudoir photography Quero-te. Com tanto desejo quanto aquele que é possível carregar numa mão cheia de saudade.  Quero-te. Com um sem fim de tremor que me percorre  como um todo-terreno pelo corpo e finda nas coxas que te pedem com urgência.  Quero-te. Com a imensidão de quem não te prende com pernas em torno das tuas ancas para que estejamos em sintonia como sempre antes havíamos estado. Quero-te. Com a sofreguidão de beijos que espalham paixão, tesão, carinho, intimidade.  Quero-te. Porque ando às voltas na cama, desperta, quente, sedenta, possuída por insonias pela tua ausência. Porque te quero. Porque me venho de amor com  com o teu toque.

Das lutas

A duvida, dilacera. O talvez, exaspera. O desconhecimento, esfaqueia. O vazio do futuro, um ingrato passeio do dia a dia.  Aceitamos que isso custa, baixamos os braços e resignamos ao imaginário conforto do pendulo do tempo.  Ou lutamos, fazemos frente ao bloqueio do convencional e acreditamos que o que bate no peito sabe sabe para onde vai. Que há uma razão de ser que sustenta a insatisfação e a inquietação pois o melhor está pra' vir.

Da cicatriz devassa

O oráculo concluiu que cicatrizo rápido, que recupero célere das mazelas, com capacidade de regeneração qual heroína de filme. Reconstruo a máquina como se não houvera sofrido danos e sigo em frente, levando por arrasto o que haja no caminho. Essa disponibilidade da derme, do corpo, da alma, em sarar será a razão pela qual sempre que te vejo, acedo. Sempre que te acercas e derrapas os dedos ao de leve pela nuca e pela espinha, atiro o pescoço para trás, fecho os olhos e deixo, sem duvidas, que me dispas. A roupa e a força. E começa o jogo. A dança. A batalha. A estratégia. A nudez completa versus o ritmo lento. A intimidade total revelada sob os teus lábios, o não querer dizimado pelas minhas pernas que te prendem a mim e nos embalam sem palavras. Sem amor. Olhos nos olhos, pacto de luxúria e suor, costas arranhadas, ombros mordidos para calar quando estão a vir os gemidos. O tempo passa contigo em mim. Sem cerimónias, ambos vitoriosos pelo que damos e pelo que r...

Dos dias sem fim

Dias sem fim à espera que viesses. Que desses um sinal. Que vivesses à altura, sem escapes. Que nada receasses.  Que te deixasses libertar sem frases feitas, calculadas. Que me olhasses directamente nos olhos, os vincasses com destrutibilidade e soubesses exactamente o que neles procurar, com a curiosidade de criança de descobrir (sempre) algo diferente. Ser arrojado em pleno, não apenas em planos  grandiosos, mas encarares as minhas olheiras de sexo, ansiedade e desconfiança e quereres mais. Sempre em fuga, qual herói de BD, com timidez desarmante, cortas com facas afiadas que são as tuas palavras, o silêncio que nos inquieta por ser demasiado confortável, íntimo, como se a segurança fosse um desconhecido risco movediço, insuportável a quem está habituado ao arame.  E a solidão é mais que um desígnio, é o que nos une. Posso-te combater, como tudo que enfrento? Posso-te roubar paz ou dizer-te que te dou sossego pois isso me suaviza as cicatrizes? D...

Da luxuria à flor da pele

Pode o desejo ser definido por palavras em linhas rectas?  Um toque traduzido em vários pontos até que se perceba? Um arrepio que cai nas páginas de um caderno?  Não há sopro que consiga expressar a pulsão. A riqueza de um idioma não é suficiente para enaltecer a corrida da luxúria à flor da pele, a percepção galopante, desabrida e as emoções febris de uma voz contida.  A vontade é como um fio de cabelo que se solta lentamente, de forma insinuante, mas com urgência e se estende por umas costas nuas expectantes.

Do cheiro a ti

Cheiro a ti. Deixaste esse cheiro pela mesa, entre os copos vazios. Pelo quarto apesar das janelas abertas de ausência. Pelos meus cabelos tão revoltos de gente perdida como a ansiedade do meu estado de espirito.  Deixaste o teu cheiro nos meus pensamentos com a mesma violência como desalinhaste o meu interior longínquo, remexeste o caminho com saciedade e com a facilidade de peregrino que sabia  o trilho.  Tenho o teu cheiro colado a mim e não sei como esquecer esse frenesim na espinha. O desejo não aplaca a falta de expectativas nem o som acelerado dos teus olhos quando te faço rir.  Deixaste o rasto do teu cheiro preso no corredor escuro, entre livros, gemidos, saudade inconfessável.  Ficou o teu cheiro algures numa rua que atravessei em sentido contrário, sob a chuva fria, calçada íngreme, passos incertos, sem receios, só o prazer do teu cheiro a devastar a carne em rodopio.  Nada mais que o teu cheiro, nem forte nem doce...

Da carnificina

De todas as vulnerabilidades que pode ela ter, ele é quem mais lhe vinca a alma. A mais rasgativa e sem explicações.  É o som da madeira a estalar que por vezes se ouve, do nada, inusitadamente, sem saber como e de onde aparece. Ele é a caneta que se procura até desistir, se julga perdida e, subitamente, aparece à descarada no sítio mais óbvio. Ele é como uma nota abandonada num casaco que já há muito não se usa e, por surpresa, se amarrota sob os nossos dedos nervosos, quando nos refugíamos, à procura de uma atenuante de ansiedade, mãos nos bolsos.  Assim é ele, esse inexplicável bloqueio dela. Tudo remonta ao que ele lhe vetou, a esses olhos tão doridos como vivos, tão carentes como assassinos, à voz tão destruidora como radiofónica. Aos beijos dele sem igual, brasa ardente que foi carnificina.   A imagem que ela guarda dele é uma sombra que a corrói. Não é boa, não é má, não existe mas perdura. Inequivocamente, ela não existe para ele e isso só lh...

Da firmeza em nós

via @ lovecherry Em algum dia tinha que estourar. Esticamos tanto a paciência, a espera, os limites da tolerância pelo que nos dão, pelo que nos sonegam, pelas meias respostas, pelos silêncios, pelos entusiasmos renovados seguidos por abruptos “já era”, pelas indecisões, pelas palavras sem conteúdo. No fundo, exaustos pelas promessas dos anúncios, dos livros, dos amigos, das infinitas possibilidades à disposição de um click. E nada, de facto, verdadeiramente revelador, substancial, honesto, genuíno, se desenrola. Tudo continua no seu ritmo de peças que não encaixam, de jogos que temos que jogar, de aparências para não mostrar entusiasmo inusitado, ou distância que não revele que também caçamos, ou um sinal de putativa carência que possa ser a queda do arame. Num dado momento, já não podemos ser o garante de tudo e todos. Assumir o nosso egoísmo é somente a sequela. Firmar o pé, com total segurança. Basta de apenas receber quando é oportuno aos outros. De termo...

Do abandono sem freio

Rompeu-me os ombros com unhas sedentas e vontade sem freio. Gemeu enquanto me forçava contra ela, trêmula, suada. Arqueava as costas de tesão à solta.  Silêncio.  Apenas deixava escapar prazer e pedia-me com os olhos que a fodesse. Mais. Intenso. Forte. Próximo. Profundo.  Beijava-me com sofreguidão e abandonava-se totalmente, deixava-me tê-la com toda luxuria, guiava em êxtase.  Satisfazê-la era um desafio. Mamas fartas que se deixavam submeter na voracidade da minha boca. Quadris irrequietos, pernas que se abriam com necessidade. Sem uma única palavra, toda ela puro sexo, delírio, despertar numa trip.  Fazê-la vir-se era droga no meu organismo a levar-me ao pico e flutuar inebriado.  

Do desespero e êxtase

Como descrever quando nem sequer quero pensar sobre isso? Apenas vivê-lo. Imensamente.  Deixar que o toque das tuas mãos faça a minha pele respirar numa tensão profunda. O coração dispara em desespero e êxtase. Não só porque cobres a minha nudez com esse olhar que não entendo o que descortina; mas pela cumplicidade contigo que me faz sentir mais despida, desejosa.  Imagino tanto e queria saber tanto mais mas prefiro silenciar-te nos meus braços e deixar que o fogo existente na minha alma se liberte. Que seja significativo, um momento disruptivo, sem barreiras, sem frases ou proclamações.

Uma mesma única pessoa

via @boudoirphoyography Por vezes, sim, tantas vezes, não.  Ora, ruído em pleno, ora ensurdecedor silencio.  Olhos que cedem ao choro, olhos que se toldam pela raiva. Dias bons, dias de tormenta. Tantas vezes perseguida pela dúvida, tão forte nas certezas. Que sucumbe ao carinho, que reage com ferocidade. Por vezes imprevisível, mas sempre em modo de sobrevivência. Ora com gargalhada destemida, ora com dor inexplicável. Aqui ou ali.  A mesma entidade, a mesma pessoa, a mesma organização de tecidos, células e substância.  

Da imaginação

Sentia-lhe o olhar intenso a queimar por entre o vestido negro.  O contorno do peito, até então discreto, parecia-lhe que ganhara uma exposição nova. Subitamente sentia que estava sob alcance da mão dele, desejava que ele o fizesse e enterrasse a boca num mamilo.  Um arrepio sulcou-lhe a espinha e aqueceu-lhe as coxas. Todos continuavam a conversar, banalidades, mas o filme sem legendas possíveis que decorria na sua cabeça era mudo, apenas entrecortados com gemidos.  Imaginava-lhe o toque, a submissão perante atitude de comando indisfarçável que ele emanava. Era como se já estivesse nua, de mãos trémulas agarradas ao parapeito sob o peso dele que a consumia ora devagar ora com voracidade quase animal.  Gotas de suor tímidas caiam-lhe pela nuca contrastando com a violência do que a devorava.