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a perversidade humana

Há uns dois anos, a minha amiga C. divorciou-se do seu mui adorado marido, um estupor de primeira, mas estas coisas acontecem. É como um melão, só depois de abrir...

Na altura, mais do que o divórcio, o que espantava C. eram os amigos, comuns ou não, que desde a separação tinham ido com o vento. Puff! Foram-se. 

Durante meses nem um telefonema, um SMS, um email, pombo-correio, a saber se ela estava bem, se se estava a aguentar, se queria um lenço para chorar, se precisava de ajuda na mudança, se necessitava de dinheiro para comprar um jarro para a água que fosse (o ex partiu tudo o que havia na antiga casa num acesso de raiva), se queria companhia para uma ida ao cinema, para um café, para uma orgia de bolos de chocolate e pipocas. Apagaram-na com uma espécie de photoshop emocional.

Porém, pior do que isto (já expectável, em conceito) foi, meses depois, quando encontrava alguns dos desertores, estes a tratarem como se nada se tivesse passado, com o maior entusiasmo como se ainda fossem grandes amigos, parceiros de fins de semana ou de férias. 

Lembro-me de falarmos sobre isto uma vez num jantar, demorado, em que analisámos quase caso-a-caso e dividimos estes espécimes em duas categorias -os cínicos e os umbiguistas. 

Os primeiros auto-explicam-se e não valem um centésimo de segundo que se possa perder com eles. É fingir que eles nem existem. 

Os outros são uma pérola. Enquanto houve drama, nem aí porque podia arruinar-lhes o décor da sua vida fabulosa; enquanto ela não estava presente nos sítios / ocasiões pelos quais eles se movimentavam, longe da vista, longe do coração e nunca lhes passou pela cabeça preocuparem-se com ela: para lá do espelho e da sua sombra, não conseguem ver mais nada. Quando a encontravam, era a alegria do costume, a simpatia do costume, a festaça porque não se lembravam sequer do que se passara na vida dela. Não lhes interessava. Não estava no seu raio de visão.

A C. sobreviveu (e bem). Já eu tenho dificuldade em encaixar isto. 

Se não fosse o joelho lixado, apetecia-me armar-me em Pepe. Sobretudo àquelas pessoas que nem pela merda do joelho perguntaram e, meses depois, ao darem à costa agem como se eu não tivesse mandado emails ou mensagens a querer combinar qualquer coisa, às quais não tive resposta, como se nunca tivesse estado presente, como se não me tivessem deixado de convidar para get-togethers ou aniversários. Como se não me tivessem apagado do universo. 

Mas esta malta é que vive feliz e eu que estou a ver o Diário de Bridget Jones (e cheia de problemas, btw).


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