É como um murro seco. Um directo com intensidade que violenta a existência. Desferido com a potência do corte mais doloroso, com a rapidez da ausência de emoção. O balouçar da corda que raspa no chão como chicote que flagela a carne mas sem deixar ferida de tão inexorável está já a pele. Viver em esquiva, não em fuga, mas na arte de estar com a guarda alta, capaz de não dar abertura ao adversário, escapar em segundos com reflexos apurados e um ataque feroz às circunstâncias, às possibilidades, aos rotundos "nãos", sem queda no ringue.
Este calor que se abateu com uma força agressiva consome qualquer resistência. O suor clandestino esbate vergonha e combate qual sabre as dúvidas. A noite feita à medida de libertinos cancela as vozes interiores que alertam para mais uma queda dolorosa. A brisa quente atordoa, embriaga no contacto com a pele. O tempo pára, as palavras suspendem entre olhares que sustentam no ar tórrido toda a narrativa; qual pornografia sem mácula, mas plena de pecado. A lua cheia transborda e dá luz à ausência de sanidade que percorre no corpo. Tudo parece possível, uma corrente de liberdade atravessa-nos com o sabor do quente esmagado. E, mesmo assim, pulsa algo mais intenso. Mais derradeiro. Mais dominador. Mais perverso que o toque dos dedos. Mais agressivo que a temperatura irrespirável. O freio da impossibilidade. A intuição luta com o medo e na arena o medo mesmo que picado tem sempre muita força. O medo acossa-nos.
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